segunda-feira, janeiro 23

Memórias: a Revolta do Juazeiro

Hoje, 23 de janeiro de 2012, faz 98 anos (quase cem anos) que aconteceu, em nossa história brasileira, um fato que ficou conhecido como Revolta do Juazeiro. Esta Revolta é fruto de dois aspectos: a manipulação popular e a força religiosa, sendo o primeiro negativo e o segundo positivo. 

Em 1914, o Brasil vivia sob o regime político da chamada "Política Café-com-Leite". A ruptura deste pacto levou à presidência o mineiro Hermes da Fonseca. Sua passagem à presidência ficou marcada pela "Política Salvacionista", política esta que fazia intervenções de tropas federais nos Estados a fim de substituir as oligarquias presentes por outras, cujos interesses somente beneficiavam o Governo Federal.

No estado do Ceará, a Política Salvacionista procurou neutralizar as influências do senador Pinheiro Machado que controlava todo o Norte e Nordeste do país. Com a derrubada da família Acioly do poder, esta, juntamente com seus coronéis e o apoio político do senador Pinheiro Machado, utilizou-se da situação religiosa do povo pobre nordestino para retomar seu poder. Para tanto, convenceu um dos maiores líderes religiosos do Ceará, senão do Nordeste, Pe. Cícero (o famoso "Padim Ciço"), para um levante armado contra a nova oligarquia do Cel. Franco Rabelo. A influência religiosa de Pe. Cícero sobre os sertanejos miseráveis levou-os a se juntarem, pegarem em armas e derrubar o poder intervencionista federal, retomando a antiga oligarquia Acioly. Os resultados desta revolta em nada contribuíram para a melhoria do sertão, ao contrário, aumentou ainda mais o poder das oligarquias tradicionais nordestinas como de Pinheiro Machado.

Novamente, a história prova que duas grandes forças juntas são capazes de grandes transformações: o povo e a religião. Com efeito, as motivações do levante popular incitado por Pe. Cícero, ao contrário de Canudos, não tinham origens populares, mas estavam a serviço das oligarquias e de seus coronéis. Do ponto de vista negativo, esta revolta mostra como a religião pode ser usada para manipular as massas convictas e distorcer por completo o sentido de se apostar numa fé. Entretanto, o mesmo fato prova, brilhantemente, como a força popular é uma arma mortal contra qualquer tipo de injustiça. O povo bem instruído é a fonte mais concreta de transformação social.

Em suma, queremos lembrar que estas duas forças - o povo e a religião - foram as duas grandes armas do cristianismo primitivo, que, bem motivado, sobreviveu aos três primeiros séculos. Pois, estes não tiveram, em seu início, a "reza do terço" ou "templos de milagres", mas pela fé no Ressuscitado, as comunidades se mobilizaram contra o massacre do Império Romano que a todo custo tentava sorvê-las. Assim, nossa proposta é justamente retomar esse casamento povo e religião de modo a reorientá-los, mediante a fé no Crucificado e Ressuscitado, para ser fermento na massa, sal da terra e luz do mundo... Para que a se converta em obras e esta em justiça em favor de todo o povo.

Juntamo-nos aos pequenos grupos que, com coragem profética, reagem bravamente contra a opressão de nosso povo, principalmente nos últimos acontecimentos que temos visto no bairro do Pinheirinho em São Jose dos Campos. Oxalá que uma Nova Revolta do Juazeiro aconteça, e que os poderosos recuem com sua covardia e podridão por medo da força popular, que, como uma avalanche, marcha em busca de sua libertação! Esperamos que as comunidades se juntem e lutem para que a utopia evangélica deixe se ser apenas u-topos (lugar de ninguém) e passe a ser pan-topos (o lugar de todos)!

Coragem e força a todos que lutam em nome do Reino da Justiça!


Utopia da Comunidade de Mateus
"Vós sois o sal da terra. Se o sal perde seu sabor, como tornará a ser sal? Não serve mais para nada;  jogam-no fora e é calcado aos pés pelos homens. Vós sois a luz do mundo. Não se pode esconder uma cidade situada num monte. Quando se acende uma lâmpada, não é para pô-la debaixo do alqueire, mas sobre a luminária, e ela brilha para todos os que estão na casa. Assim também brilhe a vossa luz aos olhos dos homens, a fim de que, vendo as vossas boas obras, eles glorifiquem o vosso Pai que está nos céus" (Mt 5, 13-16).

Pe. Victor

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