O website de notícias do Conselho Anglicano Americano (AAC) trás uma nota que ainda nos faz pensar sobre qual é o papel da religião em nossas sociedades. A chamada diz: "A Atacada Igreja Anglicana do Quênia permanece". A reportagem é do Rev. Bill Atwood, bispo sulfragâneo da Catedral de Todos os Santos em Nairobi. Assim diz Rev. Atwood:
"Se você viaja à nordeste do centro da cidade de Nairobi, Quênia na rua
Mogira e vira à direita na Distribuidora Happyland indo para a rua Juja, você passará
pela Delegacia Pagani. Passando isso é a Igreja Anglicana de S. Policarpo.
Neste ultimo domingo, a Igreja de S. Policarpo não era nenhuma “Terra da
Felicidade”. Como resultado de uma cega explosão, uma criança já morreu e oito
estão gravemente feridas. Nem mesmo a proximidade da delegacia impede os ataques.
Uma bomba explodiu às 10:30 da manhã, enquanto crianças na Escola Dominical
memorizavam versos bíblicos e aprendiam um novo hino. A polícia já confirmou
que o IED foi colocado anteriormente e, então, detonado remotamente".
De acordo com as autoridades locais, há suspeitas, bem como algumas evidências, que este atentado tenha sido provocado por um grupo da Somália chamado Shabaad que está ligados à al Quaeda. Os bispos juntamente com seu povo, na mesma nota, atestam sua coragem dizendo: "O Evangelho permanece firme", ou seja, mesmo sobre os ataques de grupos radicais, a Igreja Anglicana permanecerá firme em seu propósito.
Apesar da coragem da Igreja Anglicana local é necessário ir mais fundo nessa questão, é preciso questionar: "que papel tem a religião em nossas sociedades?", e digo sociedades pela pluralidade defendida hoje pelo multiculturalismo. Qual é a vantagem de termos uma sociedade religiosa? Essa pergunta, que de nova não tem nada, ainda ecoa em nossos ouvidos como um sino medieval conclamando para os santos ofícios. Desde quando o projeto iluminista prometeu dessacralizar a sociedade moderna como garantia de felicidade, nos percebemos perguntando: para que serve a religião? A experiência positivista comteana e o materialismo dialético já nos advertia do perigo das religiões, principalmente, pelo seu caráter de irracionalidade, no primeiro caso, e seu aspecto alienante, no segundo. Freud, inspirado por Feuerbach e toda tradição materialista, também se atreveu a mostrar os perigos psíquicos e as repressões que as religiões podem fazer em mentes não amadurecidas e histéricas. E como um golpe final a tudo que é religioso por demais, coroando a Ilustração kantiana, está a constatação fatídica e "a golpes de martelo" daquele que melhor experimentou a morte de Deus, a figura inigualável e emblemática de Nietzsche.
Olhando para a realidade religiosa de hoje, com todos seus percausos, estaria certo aqueles que milagrosamente se utilizaram da profecia religiosa para proclamar a Boa Nova que a religião não tem mais sentido? Ou pior, que nunca teve sentido? Teríamos que admitir que persistir em argumentos transcendentes à realidade empiricamente constituída é fechar os olhos para aquilo que Nietzsche nos chama a atenção, a força vital humana? Estaria certo Marx quando contata que religião e ópio já não mais se diferem? Que papel tem a religião? O que construímos por cima desse fundamento inconcursum que ele agora nada mais fundamenta? Parafraseando Heidegger, será que nossa única alternativa será a de admitir que a única condição de possibilidade do fundar é a autodeterminação de um fundamento sem-fundamento?
É impressionante (e isso é mesmo de espantar) constatar que nunca vivemos uma época onde a busca do sagrado fosse tão forte como a nossa. Haja vista o crescimento e o florescimento de Igrejas, religiões, movimentos, seitas pelo mundo todo. Acredito que a religião nunca foi palco de reflexão de modo tão forte como em nossos tempos. Todavia, ao mesmo tempo, nunca vivemos uma época em que a intolerância fosse tão avassaladora, destruidora e mortal como hoje. Acredito que nem quando as Santas Inquisições, com sua ideologia nazista de pureza da religião, fosse tão intolerante quanto nosso tempo. Vivemos num verdadeiro paradoxo! Ao mesmo tempo em que o progresso nos ajuda a repensar as bases fundantes da religião, como fazem todos os maravilhosos cientistas da religião, vivemos a ignorância e a irracionalidade das atitudes religiosas, como essa vista em grande escala no Quênia. Ao mesmo tempo em que há uma convergência para a espiritualidade como diria o saudoso Pe. Chardin , há, em contrapartida, intolerâncias irrascivas dos credos. O que isso denota? Falta de sentido ou falta de compreensão? Há ainda um deus que nos possa salvar? Ou como diria Heidegger, somente um deus mesmo poderia nos salvar.... e eu acresceria, salvar das religiões.
Neste texto não procuro oferecer respostas, nem as almejo. Como um bom professor de filosofia, que acredito ser, prefiro trazer a tona o problema do papel da religião em sociedades marcadas por contradições tão diversas como a nossa. O que esperar de movimentos religiosos? Se a religião procura estar envolta do mistério que é o sagrado, também é mistério, pelo menos à luz da razão, qual é seu real papel para a sociedade, uma vez que o re-ligare compreendido na linha agostiniana de levar as almas para a cidade celeste é muito medíocre para continuar a se sustentar. O embate não está fechado, ao contrário, continua em aberto!
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