sexta-feira, fevereiro 3

Reflexões...


Religião, hoje, é uma coisa muito interessante. Depois que filósofos como Nietzsche resolveram "matar Deus", as religiões têm se proliferado igual praga (no bom sentido, se é que tem)! Pior ainda, resolveram mudar seu campo de ação. Ao invés de disputarem fiéis e gordos dízimos de capitalistas que acham que podem até comprar o céu (já que o líder religiosos ele compra), elas, agora ,disputam "fielnautas". Que diabo é isso? É que a moda agora, segundo o último Congresso de Ciências da Religião que ocorreu em setembro do ano passado na PUC-GO, é o chamado Terceiro Espaço! Terceiro Espaço?!  Explico-me. Antigamente, as Igrejas tradicionais disputavam territórios físicos e este casamento entre Igreja e terras fez da ICAR a mais poderosa detentora de terra desde o Medievo. A modernidade engendrou outro casamento: Igreja e Mídia, que fez da IURD a religião mais cosmotelevisiva do planeta. Hoje temos um terceiro casamento: Igreja e WEB. O espaço virtual denominado Web é o que se considera o terceiro espaço. Contudo, este é, talvez, o mais terrível de todos... Os dois primeiros se caracterizavam pela entrada do elemento externo na Igreja, seja a terra, seja a mídia. O terceiro espaço faz o contrário. Não é o elemento exterior é que adentra à Igreja, mas é a Igreja que é engolida pela web. Isto significa que o determinante neste tipo de Igreja não é a fé, mas a condição em que essa fé está alocada. Aliás, a fé deixou de ser o elemento mais importante das Igrejas a muito tempo... É exatamente isso: Igrejas são criadas dentro do ambiente da net. Elas não buscam fiéis, mas fielnautas. Elas não tem altares, não tem púlpitos, não tem liturgias, não tem simbolismos, mas tem o que mais precisam: o mundo virtual. Elas são transnacionais, elas não precisam de línguas, elas falam a língua da web, a língua que o filenauta precisa.
     Com o terceiro espaço, a religião é questionada em sua essência. Se no passado religião tinha por conceito o re-ligare entre divindade e humanidade, o terceiro espaço questiona o re-ligar. A web é mais real e mais presente hoje que qualquer realidade existente. Até sexo se faz pela net! O que de re-ligar teria uma religião virtual? A religião virtual traz para o palco das questões fundamentais a religião. Contrariando as conclusões do Congresso, digo que a Igreja virtual em nada tem de problema religioso. Se olharmos atentamente por debaixo deste véu, veremos que um outro problema se esconde, e este deve ser trazido para o palco das questões. Que problema seria esse? O problema da linguagem! Por debaixo dos véus dos fenômenos hodiernos, se esconde um problema não tão hodierno. Como a linguagem explicaria tal problemática? Bem, para compreender esta questão, temos que pensar nas três funções básicas da linguagem: a intelecção, a sensibilização e a comunicação. 
     O casamento da Igreja com a terra foi motivado por uma função intelectiva da linguagem. O discurso teológico capitalista, no intuito de convencer as pobres almas que deveriam doar seu bem precioso para a Santa Mãe Igreja deveria ter uma sustentabilidade intelectual que convencesse as razões mais duras. Este modo de compreender a linguagem perdurou também nos discursos anti-capitalistas dos inflamados teólogos da libertação, que fizeram da teologia uma reflexão sociológica de primeiríssima qualidade e transformaram a pastoral em verdadeiros sistemas éticos praxiológicos. O modelo de líder era o pregador, que subia no púlpito como um sindicalista que enlouquecia as multidões com suas pregações analíticas e que faziam questionamentos intelectuais. O resultado dialético deste tipo de linguagem foi seu total oposto. A linguagem passou de uma função intelectiva para sua função sensibilizadora. Ou seja, falar de Deus era deixar aflorar seus sentimentos e emoções, pois este era o único critério de validação da experiência de Deus. Fazer religião é transformar a fé em externalização de sentimentos. O modelo de líder é o carismático (aquele que tem carismas) que com seus dons supra-sensíveis fazem plateias inteiras se comoverem, entrarem em katarse e se converterem. Ambas as funções priorizavam as massas, com a diferença da função linguística. Que modelo surgiria como terceiro momento dialético da linguagem? A função comunicativa.
     Hoje a linguagem religiosa assume a exclusividade da função comunicativa. Com grandes templos, todos  gozando de tecnologias do século XXIII, são administrados por pessoas do século XIX... Ou seja, há um disparate entre instrumento e mensagem. Grande parte dos investimentos na área de religião vão para tecnologias como, arquitetura, equipamento de som, vestimentas litúrgicas, canais de tv e internet etc. Há uma preocupação exagerada na função comunicativa da linguagem, como se só bastasse se comunicar para que o fiel se converta e "compre", literalmente, seu produto. Em contrapartida, a mensagem pouco ou quase nada tem valor. Não importa o que se diz, mas o como se diz. A entrada da Igreja na net ratificou nossa tese de tal modo que até elementos essenciais como fidelidade religiosa foi relegada pela máxima da comunicação, o mais importante é que as pessoas consigam acessar o GODTUBE, independente de que confissão são. Anátema, não é mais que abandona ou transgride algum código canônico, mas quem deixa de acessar uma pregação exaltada de um pastor online. Por fim, o que se percebe é um problema de linguagem. Dependendo da função que ela assume, um modo de ser é expresso. A pergunta que fica é: o que nos resta? Talvez tivéssemos que fazer como Nietzsche, com uma diferença, não matar Deus, pois ele ressuscita no terceiro dia, mas matar certas linguagens, que aí, quero vê-la fazer o mesmo...


Pe. Victor

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