"Eu estava viajando, já perto de Damasco, e era mais ou menos meio dia.
De repente, uma forte luz que vinha do céu brilhou em volta de mim.
Eu caí no chão e ouvi uma voz que me dizia:
'Saulo, Saulo, por que você me persegue?'."
(At 22, 6-7)
Hoje, 25 de janeiro, a Igreja Anglicana celebra a Festa da Conversão de Paulo (de acordo com o The Book of Divine Worship). O texto acima mostra o início do relato paulino sobre sua conversão, escrito por Lucas no livro dos Atos. A experiência paulina nos ajuda a refletir dois pontos importantes para nossa caminhada de fé: o significado de conversão e a atitude cristã.
Conversão
Paulo, que antes era um dos maiores perseguidores dos cristãos: "Persegui os que seguiam este Caminho e fiz com que alguns fossem condenados à morte" (v.4), após uma experiência com Jesus de Nazaré, se converte ao cristianismo. Ora, o que significa conversão? Literalmente, o verbo converter significa "mudar de rumo". Este, de fato, é o sentido que muitos de nossos irmãos tomam para se referir à conversão em sentido religioso. Todos aqueles que, antes era de um jeito e faziam determinadas coisas e depois, por algum motivo, mudam sua vida, aderindo a uma religião, afirmam que se converteram. Converter, ainda, pode ser usado como migração de Igrejas: "me converti à Igreja tal...". Ou, como sinônimo de falso moralismo: "Mas você não bebia?" - "Ah sim! Mas hoje me converti!". Ou, pior ainda, identificando aquele que já tem o céu garantido: "Você não vê que sou um convertido?!". Todos estes significados para o termo conversão, em sentido religioso, não conseguem dizer da originalidade deste ato. É necessário açambarcá-lo de modo original.
Paulo, em seu testemunho, nos ajuda a entender o que é converter-se: "Eu perguntei: Senhor, o que devo fazer?" (v.10). A experiência paulina da conversão o leva imediatamente a uma postura de serviço. Ao contrário dos significados anteriores, quem se converte não coloca a tônica deste ato em si mesmo, "eu me converti...", mas naquele que, de fato, receberá o benefício pela sua conversão, "o que devo fazer?". A pergunta de Paulo a Jesus, no seu momento de conversão, mostra justamente que não era ele o grande beneficiado com aquela experiência, por isso sua pergunta enfática se colocando em atitude de total serviço. Assim, converter, muito mais que mudar de rumo, significa "verter-com", ou seja, se inclinar junto, se colocar todo a disposição. Este deve ser o sentido que precisamos cultivar em nossas comunidades. Pessoas convertidas são pessoas que se colocam junto a serviço das outras, que se vertem para aqueles que nada possuem. São pessoas que sabem que não são elas as grandes beneficiadas com sua conversão. Isto arranca do coração humano a pretensão da posse da conversão.
A Atitude Cristã
Outro ponto relevante da festa de hoje é a atitude cristã. A experiência de Paulo é um diálogo e não um monólogo. Jesus pergunta e Paulo responde. Anterior à resposta de Paulo, uma pergunta certeira o atinge: "... por que você me persegue?" Esta pergunta, mais forte que a própria luz brilhante de que fala o texto, o tomba no chão e o deixa cego. Não foi o relato miraculoso lucano, "um forte luz que vinha do ceu brilhou em volta de mim" (v.6), que determinou a resposta paulina, mas a pergunta a ele dirigida: "... por que você me persegue?". Paulo, em sua experiência de conversão, tem o encontro face a face com aqueles que tombaram, vítimas de suas mãos. Paulo, na sua conversão, também tomba, ou seja, é levado à condição daqueles que tanto ele desprezava. A dor de Paulo, ao ver os milhares de rostos dizimados pela sua ignorância religiosa, provoca nele um estado de cegueira que o leva a uma mudança de postura.
Contudo, ainda hoje, existem irmãos e irmãs "convertidos" que continuam perseguindo o povo de Deus em nome de sua conversão. Milhares de pessoas, todos os dias, são perseguidas pela ignorância religiosa e exploradas até o último centavo por déspotas esclarecidos, ou pior, convertidos. A experiência paulina de conversão tem que ser para nós um grande tombo. Tem que ser o encontro justamente com as pessoas que mais nós perseguimos, humilhamos e matamos em nosso dia a dia. A conversão tem que levar-nos aos olhos daqueles que menos queremos ver e a ouvir a pergunta que não queremos ouvir: "... por que você me persegue?". A conversão, parafraseando Francisco de Assis, tem que ser o encontro com o amargo, até que este se converta em doce! Esta é a verdadeira atitude cristã, uma atitude de encontro e serviço, uma atitude de verdadeira conversão. Enquanto ainda escutarmos a pergunta "... por que você me persegue?", não experimentaremos a conversão.
A nós todos e todas, que Deus nos ajude a assumirmos verdadeiramente o sentido da conversão cristã para que a pergunta "... por que você me persegue?" se transforme na resposta "o que devo fazer?"
Pe. Victor
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